Descrição
Lembro, em criança, do Dia do Soldado comemorado em Alegrete. Depois de alguns meses de instrução, aqueles conscritos interrompiam a garbosa marcha militar para, em plena praça, jurarem fidelidade à pátria brasileira. De certa forma, os autores desta coletânea de contos se assemelham aos soldados da minha infância. Chegaram um dia à oficina literária vindos de diferentes experiências de vida e trabalharam juntos durante muitos meses para desvendarem os mistérios da arte de escrever. Acertaram o passo para entenderem a cadência de diferentes técnicas essenciais, como a hiperestesia (uso dos cinco sentidos na narrativa), adequação do tempo verbal, equilíbrio dos três elementos da narrativa (personagem, ambiente e ação), economia no emprego de adjetivos, possessivos e outros ismos, atenção constante ao foco narrativo, ao dito sanduíche invertido, do antropomorfismo e de outras técnicas que distinguem o escritor profissional do amador (como separam quem toca por música de quem só "toca de ouvido"). Aprenderam, escrevendo em casa e em sala de aula, que o processo criativo é único para cada um de nós, podendo identificar-nos literariamente como nossas impressões digitais. Entenderam a importância de não interromper o fluxo criativo, só se preocupando em revisar e polir o texto depois de escrito e não durante sua elaboração. Reconheceram, no exercício de escrever, como a arte é uma só, sendo muito semelhantes os processos criativos de escritores, pintores, musicistas. E que todas as artes podem servir de inspiração a um conto, como acontecia com Hemingway, que buscava escrever como Cézanne pintava, ou Van Gogh, que encontrou na prosa de Balzac o caminho para muitos de seus quadros. Raramente tive a oportunidade de reger uma orquestra de escritores tão afinada como esta de Amarildo, Andrea, Ângela, Carlos, Helena, Katya, Luiza, Marcelo, Nelson, Odone, Paulo e Terezinha. Um grupo que desenvolveu seu talento natural valorizando cada ensinamento e tratando de colocá-lo em prática em seus contos subsequentes. Um verdadeiro conjunto de novos escritores que valorizam este livro e a instituição que nos agasalha, o Contemporâneo, exatamente nas comemorações de seus vinte anos de existência. Uma casa dedicada à psicanálise, reconhecida no Brasil e no mundo, que sabe abrir suas portas à formação de novos escritores, honrando os ensinamentos de Freud, que foi buscar em Shakespeare, Cervantes, Goethe, Thomas Mann a essência de suas mais importantes teorias sobre a mente humana. Quanto ao ato de jurar fidelidade à literatura, embora não exista formalmente, acontece cada vez que damos o melhor de nós para a arte da palavra escrita. Quando buscamos transferir nossa emoção ao leitor, sem nos acovardarmos diante do que eu chamo de "striptease mental", muitas vezes mais difícil que o desnudamento físico. E lutando sempre contra os preconceitos que aviltam quem escreve e quem lê. Consciente de que este livro não é experimental, que seus autores dominam o essencial da arte de escrever, e que poderão, em futuro próximo, ter seus nomes reconhecidos, eu avalizo cada um deles com absoluta convicção.